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Como o Bolsa Família Preveniu o Êxodo Rural

Como o Bolsa Família Preveniu o Êxodo Rural

Pesquisa Revela o Impacto do Programa na vida dos Agricultores

Em uma descoberta surpreendente, um estudo conduzido pelo Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) revela o impacto do programa Bolsa Família está ajudando agricultores vulneráveis a permanecer no campo, frente às mudanças climáticas no Brasil e no mundo, evitando o êxodo rural dos anos 1970 e 80. Esta pesquisa, a primeira a correlacionar detalhadamente programas sociais e alterações climáticas em áreas rurais do país, revela dados interessantes sobre o comportamento migratório de produtores rurais em face de secas severas.

14,3 milhões de produtores rurais vulneráveis

O estudo, intitulado “Política Social e Resiliência: Uma análise geoespacial do impacto das mudanças climáticas nas decisões de migração entre produtores agropecuários vulneráveis”, mergulhou fundo na realidade de 14,3 milhões de produtores rurais vulneráveis no Brasil. Deste total, impressionantes 76% são beneficiários do programa Bolsa Família, destacando a importância crítica deste auxílio para o elo do setor agrícola mais frágil do país.

Metodologia inovadora: Cruzando dados climáticos e sociais

A pesquisa do IMDS se destaca por sua abordagem metodológica refinada. Utilizando uma combinação de bases de dados, incluindo o Cadastro Único, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), e séries históricas de precipitação desde 1981, os pesquisadores conseguiram mapear com precisão o impacto das secas nas regiões mais afetadas entre 2015 e 2019.

Paulo Tafner, presidente do IMDS e economista, explica:

“Nossa pesquisa analisa o fenômeno da migração através de duas lentes combinadas: a seca na mudança climática e a renda garantida do Bolsa Família. Os resultados são fascinantes e, em alguns casos, contraintuitivos.”

Resultados surpreendentes: O duplo papel do Bolsa Família

O estudo revelou que o Bolsa Família desempenha um papel complexo na decisão de migração dos agricultores:

Em secas fortes, mas contornáveis: A taxa de beneficiários do Bolsa Família que deixou suas residências foi 4% menor em comparação com não beneficiários. Isso sugere que o programa auxilia os agricultores a resistir e se adaptar em seu local de origem.

Em eventos climáticos extremos: Surpreendentemente, em áreas que sofreram com secas extremas (1% da área mais seca do Brasil), a taxa de migração entre beneficiários do Bolsa Família foi 7% maior do que entre não beneficiários.

“O Bolsa Família ampara a decisão do agricultor”, afirma Tafner. “Ele ajuda o beneficiário a resistir quando a seca é forte, porém contornável. Por outro lado, em casos de estiagem extrema e rara, o programa facilita a migração, oferecendo um suporte financeiro para a mudança.”

Adaptação local em vez de êxodo urbano

Um dos achados mais interessantes do estudo é o padrão de migração observado. Diferentemente das grandes secas do passado, que resultavam em êxodos massivos para capitais e grandes centros urbanos, a pesquisa mostrou que a maioria dos migrantes optou por se mudar dentro do mesmo município ou para cidades próximas no interior do estado.

Vinicius Schuabb, coautor do estudo, comenta: “Nas sociedades modernas, migrar é incomum. As pessoas tendem a permanecer onde têm vínculos sociais, culturais e econômicos. O que observamos foi uma tentativa de adaptação no ambiente já conhecido.”

O estudo mapeou os impactos em diferentes regiões do Brasil:

  • Minas Gerais: O estado mais prejudicado no Sudeste, com quase meio milhão de afetados por secas.
  • Bahia: Estado com o maior número de agricultores vulneráveis (2,5 milhões), com quase metade afetada por estiagens.
  • Maranhão: Proporcionalmente o mais afetado, com 57% dos agricultores vulneráveis impactados por secas severas.

Desafios futuros e implicações políticas

Erika Ramos, cofundadora da Rede Sul Americana para Migrações Ambientais (Resame), destaca a importância deste tipo de pesquisa:

“Apesar de secas e eventos climáticos extremos já serem uma constante, as vítimas, especialmente as mais vulneráveis, permanecem invisíveis. Estudos como este são cruciais para a criação de políticas públicas efetivas.”

O IMDS planeja expandir a pesquisa para áreas urbanas, investigando o efeito do Bolsa Família em casos de eventos climáticos como temporais que levam a deslizamentos e enchentes.

Este estudo pioneiro não apenas ilumina a complexa relação entre programas sociais e resiliência climática, mas também destaca a necessidade urgente de políticas públicas adaptativas. À medida que as mudanças climáticas se intensificam, compreender como programas como o Bolsa Família podem ser otimizados para proteger as populações mais vulneráveis torna-se cada vez mais crucial.

O trabalho do IMDS abre caminho para uma nova era de pesquisas interdisciplinares, combinando análises socioeconômicas com dados climáticos para informar políticas mais eficazes e humanas. Resta agora aos formuladores de políticas públicas absorver essas descobertas e traduzi-las em ações concretas que possam fortalecer a resiliência das comunidades rurais brasileiras frente aos desafios climáticos do século XXI.

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