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Brasil perde US$ 2,3 bilhões com atrasos em Portos e Crise Logística ameaça exportações

Brasil perde US$ 2,3 bilhões com atrasos em Portos e Crise Logística ameaça exportações

Tempo de espera de navios chega a 12 dias em terminais brasileiros e prejudica competitividade no comércio internacional

Em um cenário de crescente movimentação de cargas em uma infraestrutura defasada, os portos brasileiros enfrentam uma crise silenciosa que drena bilhões da economia nacional. Um estudo recente da consultoria Bain & Company revela que os gastos com demurrage (taxa cobrada quando a carga permanece no terminal além do prazo acordado) atingiram o alarmante patamar de US$ 2,3 bilhões em 2024, um aumento de US$ 300 milhões em relação ao ano anterior.

Números que impressionam

O levantamento, que considera a movimentação de granéis e contêineres, aponta para uma tendência preocupante no setor portuário brasileiro. Com a movimentação de cargas crescendo entre 3% e 4% ao ano – impulsionada principalmente pelas exportações agrícolas – a pressão sobre a infraestrutura portuária do país só tende a aumentar.

“Com maior fluxo de embarcações e maior demanda nos portos, há uma tendência natural de aumento nas sobre-estadias”, alerta Felipe Cammarata, sócio da Bain & Company. Segundo o especialista, fatores como problemas climáticos, volume elevado de embarcações, gargalos de infraestrutura e excesso de burocracia são os principais responsáveis pela alta nos gastos com demurrage.

A situação é ainda mais alarmante no segmento de porta-contêineres. Um levantamento da consultoria Solve Shipping contabilizou 1.127 cancelamentos de escalas nos principais portos do país em 2024, incluindo terminais estratégicos como Santos (SP), Salvador (BA) e Paranaguá (PR). O número representa um crescimento de quase 50% na comparação com o ano anterior.

Atrasos e cancelamentos: o efeito dominó na economia

Os atrasos também aumentaram significativamente. Navios que chegaram mais de 12 horas depois do horário previsto cresceram 33%, totalizando 3.122 ocorrências em 2024. Em contrapartida, as escalas pontuais, de embarcações que chegaram na hora acordada, despencaram mais de 40%, somando apenas 891 no mesmo período.

“Cancelamentos são um sintoma muito claro do abarrotamento dos terminais”, explica Leandro Carelli, sócio da Solve Shipping. Dos treze terminais monitorados pela consultoria, nove operam com capacidade acima do patamar considerado ideal pelo setor (65%), incluindo importantes terminais de Santos, no litoral paulista.

Outro problema crítico é a limitação de calado – a parte do navio que fica submersa. Para a operação de navios modernos a plena capacidade, o calado ideal é de 16 metros, profundidade superior à disponível na maioria dos portos brasileiros. Isso força grandes embarcações a operarem com capacidade reduzida, prejudicando diretamente o volume de exportações.

O impacto global das ineficiências portuárias brasileiras

Luis Claudio Montenegro, especialista em engenharia do transporte, alerta para as consequências em cascata desses atrasos: “No limite, o navio pula aquela escala. Se ele chegou e sabe que vai demorar muito, o navio não fica esperando, vai embora e descarrega no próximo porto, e a carga que está para ser embarcada acaba ficando.”

O especialista ressalta que as cargas “conteinerizadas” são de maior valor agregado e fundamentais para empresas que trabalham com o modelo just-in-time, ou seja, sem estoques. “Quando falta estoque ou não se consegue fazer uma venda, não recebe, não separa a produção e assim por diante. O impacto é gigantesco”, completa Montenegro.

Além disso, os atrasos e filas de navios nos portos brasileiros podem encarecer significativamente o custo do frete, já que os armadores passam a considerar um tempo maior do que o combinado com os importadores, afetando clientes em todo o mundo e reduzindo a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.

Soluções em andamento: a corrida contra o tempo

Alguns terminais já tomam medidas para enfrentar o problema. O porto de São Francisco do Sul, em Santa Catarina, que movimenta soja, milho, produtos siderúrgicos, fertilizantes, madeira, papel e celulose, vem investindo em infraestrutura para combater o tempo de demurrage e diminuir a fila de espera das embarcações.

“Estamos bastante competitivos, mas não nos damos por satisfeitos”, afirma Guilherme Medeiros, diretor de operações do porto catarinense. Entre as obras previstas está uma dragagem de aprofundamento para melhorar o canal de acesso e permitir ao terminal receber navios de calados maiores. O edital para a contratação da empresa que fará a obra foi lançado no início de abril.

O terminal também prevê a expansão de um dos berços (local de atracação do navio para embarque e desembarque) e já realizou investimentos importantes nos ritos de acesso, incluindo novas balanças para maximizar o fluxo de cargas.

Os resultados começam a aparecer: o tempo de espera dos navios para atracar no terminal foi de pouco mais de 9 dias entre janeiro e fevereiro deste ano, uma queda significativa na comparação com o mesmo período de 2024, quando a espera chegava a quase 12 dias.

O entrave burocrático: quando o papel pesa mais que a carga

Para solucionar definitivamente os entraves logísticos, o setor aponta a necessidade de obras de ampliação da infraestrutura, como dragagens, e novos leilões de terminais. No entanto, essas soluções esbarram no que especialistas chamam de “excesso de burocracia” por parte do governo federal.

“Hoje, construir um terminal no Brasil leva entre 7 e 10 anos. Desde o início do processo de autorização, licenciamento, até entrar em operação. A demanda está crescendo numa velocidade que a burocracia não está permitindo que a oferta acompanhe”, critica Carelli.

Enquanto o Brasil não consegue agilizar seus processos, perde competitividade no cenário internacional e vê bilhões de dólares escoarem pelos mesmos portos que deveriam impulsionar sua economia.

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