“Anteontem fiz uma audiência, tenho trabalhado; recaí com o dinheiro dessa audiência”, disse
Em uma das ruas mais movimentadas da Região Central de Goiânia, a história de drama pessoal de mais um invisível se revela. Um homem, que pede para não ser identificado pelo nome, nem ter o rosto exposto, sabe o princípio do Direito da Imagem (artigo 5º, Inciso X da Constituição Federal). Recaído há dois dias, pelo uso do crack, ele não poupa em começar a conversa com o dilema: “Sou ‘noiado’ desde os 15 anos, mas sou advogado, tenho cinco filhos e estou recaído desde anteontem”. O jovem em uma das adjacentes da Rua 44, no Setor Norte Ferroviário. A região tem sido tomada pelos usuários de drogas e pessoas em situação de rua.
A revelação da história dramática foi feita pelo perfil Paulo Lima, um estrategista em finanças que, através do Instagram, conta histórias. Ele usava um cartaz escrito: “Me conte uma curiosidade e ganhe R$ 20”, quando foi abordado pelo homem que queria contar a própria história, com autorização para divulgar o vídeo, mas com uma condição: “Sem passar meu rosto, nem meu nome, para não perder a minha OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)”.
“Anteontem fiz uma audiência, tenho trabalhado; recaí com o dinheiro dessa audiência e, tudo o que eu fiz na vida de bom, foi lutando contra a dependência química, mas ela me derruba vez ou outra, igual de anteontem pra cá”, desabafa o entrevistado. Para saber o que provoca nele as recaídas, Paulo Lima pergunta: “Que loucura, cara. Qual o gatilho aciona na sua cabeça para (chegar a) isso?”
A resposta surpreende. “Egocentrismo. Achar que se pode um pouquinho. Só que o Narcóticos Anônimos (NA), que veio dos Alcoólicos Anónimos (AA), explica que ‘uma é muito e mil não bastam’, ou seja, eu não posso ‘uma’ e ‘mil’ não é (sic.) suficiente, porque eu estou aqui, ainda”. Um dos ensinamentos do NA é: “A única maneira de não voltar à adicção ativa é não tomar aquela primeira droga”.
O homem ainda conta os detalhes de como entrou na vida adicta. “Desde os 15 anos conheci ‘merla’ (uma pasta grosseira, à base de cocaína), entre outras drogas, formei, casei, fui quase 16 anos casado; está há um ano e dois meses inteirando que eu separei; foram cinco filhos — um enteado de 18 anos e quatro filhos com essa mesma mulher.”
EXEMPLO
A postagem, que é um exemplo de vida, revela não só a presença de um advogado formado e ativo na Ordem em situação de rua, depois de mais uma recaída, mas a necessidade da ampliação de políticas públicas voltadas para dependentes. O post, que já tem mais quase 608 mil visualizações, é a clareza da necessidade de áreas profissionais se voltarem para a atenção que dão às próprias categorias. A OAB seccional Goiás, tem a Comissão de Direito da Saúde (CDSA), que é voltada a assistência os advogados da área, mas não à assistência dos próprios advogados. Em contrapartida, a Caixa de Assistência dos Advogados de Goiás (CASAG) proporciona plano de saúde com convênio à Unimed Goiânia, mas não informa se há algum tipo de tratamento para quem precisa de ajuda com dependência química.
O fim do vídeo é com o advogado, que teve todo o dinheiro dos honorários advocatícios da última causa gastos com drogas a oferecer uma jujuba para o entrevistador. Paulo Lima rejeita. Não é divulgado se a promessa de dar R$ 20 pela história contada foi cumprida.
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